AVISOS IMPORTANTES:
1. Se você tem problemas com spoilers, simplesmente pare de ler aqui.
2. Se você não assistiu as duas trilogias de Star Wars e o Episódio VII, o primeiro filme da Terceira Trilogia lançado até o momento; ou se assistiu esparsamente apenas alguns dos sete filmes; ou se assistiu apenas ao Episódio VII para acompanhar seus amigos nerds no cinema (e, obviamente, não entendeu absolutamente nada do que viu e ouviu e ficou boiando nas discussões); ou se não sabe que Darth Vader é pai de Luke Skywalker, sugiro que você primeiro assista a TODOS os sete filmes e depois volte aqui para ler estas considerações.
3. Se você ainda está aqui e está lendo este terceiro aviso importante, saiba que eu não me responsabilizo pelo que as considerações abaixo podem causar em sua vida. A partir daqui você está por sua própria conta e risco.
A tão esperada
Terceira Trilogia de Star Wars, há
tempos anunciada, chegou finalmente. Milhões de pessoas foram aos cinemas para
assistir ao Episódio VII – O Despertar da Força, o primeiro dos
três novos filmes que dão continuidade à saga da Força pela Galáxia.
Os velhos fãs
ficaram felizes em rever velhos amigos de pipoca — Han Solo, Chewbacca, Princesa
Leia (agora General...), C-3PO e o amado R2-D2 — e conhecer novas figuras que têm
potencial (que fofura é aquele BB-8!). Já os jovens fãs (sim, porque o
que tinha de adolescentes e jovens de todas as idades nas sessões que fui era
incrível!) puderam também, é claro, rever em novo contexto várias personagens
clássicas da série e encontrar seus próprios pontos de identificação entre as
novas personagens introduzidas.
Nostalgia e
novidades à parte, a pergunta que ficou no ar é quais as intenções e pretensões
do Episódio VII em relação ao núcleo
principal do universo de Star Wars?
Essa pergunta leva a uma questão mais ampla: quais as intenções e pretensões
desta Terceira Trilogia como um todo (que na verdade é uma Tetralogia, pois há
um filme inteiramente dedicado a Han Solo prometido para 2018, entre o Episódio
VIII e o Episódio IX) em relação a esse universo ficcional?
Em reflexões
pessoais e em conversas com parentes e amigos fãs da série, eu tenho buscado
possibilidades de resposta a essas questões. É claro que muitas ideias e
teorias tem me ocorrido; mas é claro também que nenhuma dessas minhas ideias e
teorias tem um fundamento mais sólido em razão de um aspecto evidente: em
termos de enredo, o Episódio VII é
muito mal construído e, por essa razão, deixa mais fios soltos do que J. J.
Abrams foi capaz de amarrar (propositalmente? Tenho minhas dúvidas...).
Os comentários
que seguem são essas minhas ideias e teorias ainda infundadas, as quais
compartilho aqui com vocês ao mesmo tempo em que as documento para a posteridade,
ou seja, para futuramente comparar com o que será trazido nos lançamentos dos
próximos dois filmes da Trilogia mais o filme sobre Han Solo.
Comentários,
contra-ideias e contra-teorias são, evidentemente, sempre bem-vindos.
Começo com o
ponto principal: a famigerada morte de Han Solo pelas mãos de seu filho Ben
Solo, o qual usa, ao que tudo indica, seu nome de batismo Sith, Kylo Ren, no
enredo do Episódio VII.
Não há sombra de
dúvida que a morte de Solo-pai foi a cena mais impactante (mas não a mais
importante) deste primeiro filme da Terceira Trilogia. Meu irmão Vanberto não
se conforma até agora, e ainda ressoa em meus ouvidos o silêncio sepulcral que se
instalou nas salas de cinema no momento em que isso aconteceu.
É a partir dessa
cena que algumas polêmicas se instalaram, principalmente a extremamente
discutível (e, em minha opinião, completamente furada) hipótese aventada por
Jimmy Piroutek ("A melhor teoria do mundo sobre Star Wars veio da Mooca"),
amplamente divulgada em sites nacionais e internacionais e redes sociais, de
que Kylo Ren foi para o Lado Negro da Força como agente duplo com os objetivos
de ajudar a Resistência e eliminar o Supremo Líder Snoke.
Encaremos os
fatos: a personagem Kylo Ren, criada com o intuito evidente de dividir o posto
de personagem principal junto de Rey, é muito mal-ajambrada e está sobrando no
enredo do Episódio VII. A culpa disso
recai no diretor J. J. Abrams, que tentou a todo custo tornar Ren uma
personagem convincente usando para isso unicamente seu parentesco e obsessão
doentia pelo inigualável e inimitável Darth Vader.
Kylo Ren é, em
tudo, uma tentativa falha e de mal gosto de imitar Vader em duas perspectivas
que não se ajustam: ele tenta arremedar Jedi/Sith/Jedi psicológica e
fisicamente – usa uma máscara desnecessariamente, veste-se de preto
desnecessariamente (e sem a capa glamorosa que era uma das marcas registradas
do figurino do grande vilão) e fez um altar com a máscara remanescente da pira
funerária do Lord Sith!!! (Eu estou absurdado com isso até agora...).
Esse último
gesto merece um comentário particular. Rememoremos a cena do Episódio VII: Kylo Ren está dentro de uma
sala que lembra a sala particular onde Vader retirava a sua própria máscara
para curar suas feridas físicas (essa sala aparece de modo mais claro no Episódio V da saga). Nesse momento, a
câmera foca a máscara de Ren enquanto ele faz uma espécie de oração a seu
antepassado: “afaste-me da tentação da Luz” e “ajude-me a completar a sua
missão”. Após a oração, eis que a câmera se move novamente para revelar o ídolo
ao qual a prece fora dirigida: a máscara calcinada do próprio Vader.
O que era para
ser uma cena assustadora, cheia de significados e revelações, torna-se quase
cômica quando começamos a pensar como essa máscara foi parar nas mãos desse
neto transviado: Ren teve que ir à lua de Endor onde foi feita a pira funerária
de Vader por Luke Skywalker, enfrentar os ewoks (que são fofinhos, mas
perigosos), encontrar o local da pira e, absurdo dos absurdos, pegar a máscara
do avô, a qual contém também o seu crânio (sim, a tomada de câmera da cena em
questão do Episódio VII dá um close
bem demorado no crânio existente dentro dos remanescentes da máscara de
Vader...).
Começo a rir ao
pensar em Kylo Ren enfrentando os ewoks, ao mesmo tempo em que começo a chorar ao
pensar nessa personagem bancando o ladrão de túmulos, praticamente um ghoul das estrelas ou uma versão
futurista de Victor Frankenstein.
Essa situação
tragicômica leva à segunda das perspectivas para o fato de Ren ser uma imitação
de mal gosto de Vader: além de ser um arremedo do grande Sith Lord, Ren é
materializado no enredo do Episódio VII
como o novo Darth Vader, discípulo do último Jedi existente (Luke Skywalker) que
se rebela contra este e sua Ordem para se tornar discípulo de uma
pseudo-imitação bastante discutível do antigo Imperador (Snoke) que,
hipoteticamente, o levou para o Lado Negro da Força, tornou-o seu “escolhido” e
com ele conversa por meio de um holograma duas vezes maior do que o usado por
Palpatine para conversar com Vader.
É ofensivamente
pretensioso, por parte de J. J. Abrams, meramente cogitar a possibilidade de
que possa existir uma outra personagem, parente ou não, capaz de ocupar o lugar
de Vader no imaginário ocidental, e é pensando nas implicações de tamanha
ofensa que adentro em problemas que me parecem muito mais sérios na trama do Episódio VII em relação ao enredo
principal da saga, quais sejam a abordagem da Força escolhida por Abrams, a
falta do elemento filosófico que é característico da série como um todo e a
incômoda semelhança do enredo do Episódio
VII com o enredo do Episódio IV.
Quanto à
abordagem da Força mostrada no Episódio
VII, é notável que ou J. J. Abrams não entendeu o conceito (o que eu não
duvido...), ou a Força está passando por um momento ainda mais grave do que nas
duas trilogias anteriores.
Como a primeira
dessas duas hipóteses tem implicação direta com o segundo problema que listei,
vou abordá-la quando tratar da questão da falta do elemento filosófico. Por
hora, pensemos na possibilidade de que a Força está passando por uma crise mais
séria.
Se voltarmos à
personagem Kylo Ren na perspectiva da Força, notaremos que estamos diante de
alguém que recebeu algum treinamento formal (Jedi por parte de Luke, tendo em
vista que Ren é o discípulo que se revoltou contra a Ordem Jedi Restaurada que
Luke tentou formar; e Sith por parte de Snoke, visto que este é o líder do
grupo que se formou a partir dos remanescentes do Primeiro Império Galáctico –
a Primeira Ordem – e é, provavelmente e segundo minhas interpretações pessoais,
um antigo integrante do Inquisitorius), mas que não consegue controlar seu
emocional, recaindo constantemente em arroubos violentos de ódio, o que torna
seus poderes também descontrolados. Esse tipo de comportamento é totalmente
inapropriado tanto para um Jedi quanto para um Sith, logo, Kylo Ren está
perdido entre, no mínimo, duas perspectivas diferentes de abordagem da Força.
Esse drama do
sempre estar dividido era o grande drama de Darth Vader e permanece uma espécie
de maldição que assombra toda a família Skywalker. Todavia, seu absoluto
comedimento e a frieza imprimiam um aspecto complexo e trágico a esse drama. Os
arroubos violentos de Ren, no entanto, geram um efeito contrário e enfraquecem
sobremaneira a personagem, que claramente foi eleita para ser o grande vilão
dessa Terceira Trilogia, bem como o drama em si. Com seu comportamento, Ren
torna o drama da ambiguidade, da luta interna entre Bem e Mal, entre Lado da
Luz e Lado Negro, entre Anakin Skywalker e Darth Vader, algo caricatural, tolo,
sem sentido, praticamente a manha de uma criança mimada. Não é essa, de forma
alguma, a concepção dada por George Lucas ao enredo de Star Wars, e vejo nesse ponto o catastrófico “efeito Disney” em
ação, que torna uma idiotice tudo que toca.
É justamente
essa idiotice, a manha de uma personagem construída para ser o vilão, que vai
fazer com que Ren perca a luta contra Rey. Veja bem, minha gente, a situação
que nos é apresentada nessa luta: o líder dos Cavaleiros de Ren – uma ordem
treinada de Force Sensitives estruturada aos moldes da Ordem dos Cavaleiros
Templários (notemos que o lightsaber
de Ren tem o formato exato de uma espada cruzada, a espada dos Cavaleiros
Templários) –, com certa quantidade de treinamento formal nos dois lados da
Força, capaz de parar no ar um tiro de raio laser só com os poderes que
adquiriu (admito: essa cena foi genial!), é derrotado por uma Force Sensitive cujos
poderes despertaram recentemente e que não detém nenhuma espécie de
treinamento. Apesar de ter sido uma batalha memorável, a cena faz tanto sentido
quanto a do ex-Stormtrooper Finn lutando com o lightsaber de Luke Skywalker contra um outro Stormtrooper: quando o
lightsaber portado por Finn toca a
arma de luta do inimigo, tal arma permanece intacta, quando deveria ter sido
cortada ao meio, já que há pouquíssimos elementos existentes no Universo que
são suficientemente resistentes para suportar o golpe de um lightsaber sem serem destruídos
imediatamente. Ou seja, as duas cenas são totalmente incoerentes dentro de
todos os preceitos já estabelecidos na saga: um Force Sensitive sem treinamento
formal não é páreo para um Force Sensitive treinado (lembremos do famigerado –
descartável para a trama, porém útil como exemplo – Episódio I), e o The Jedi
Path aponta apenas seis elementos que podem resistir ao golpe de um lightsaber (cortosis, ultracromo, neurânio,
phrik, ferro mandaloriano e os ossos e carapaças de algumas poucas criaturas).
Mas é claro que, se os fãs reclamarem demais, Abrams vai dar um jeito de
explicar esses deslizes flagrantes de quem não conhece adequada e
suficientemente o universo ficcional com o qual está trabalhando.
Assim, é preciso
que a Força esteja praticamente em vias de extinção para que haja um despertar como
o ocorrido com Rey (e provavelmente com Finn também). A considerar que as duas
primeiras trilogias da saga narram a história do desequilíbrio da Força e suas
consequências e que, nos trinta anos que se passam entre a Batalha de Endor e o
presente narrativo do Episódio VII,
Luke Skywalker, o último Jedi vivo, não conseguiu reestabelecer ou criar uma
ordem sob a qual o Lado da Luz pudesse se organizar, é exatamente nesse estado
que a Força se encontra: fragmentada de tal maneira, dividida a tal ponto, que
é necessário zerar tudo e retornar ao início. É por essa razão que, no Episódio VII, é dito que Luke
desapareceu e foi para o lugar onde foi construído o primeiro templo Jedi, o
local onde os Force Sensitives começaram a se organizar para melhor entender a
manifestação do poder que sustenta a existência. Como o nome desse lugar não é
revelado no filme, mas apenas mostrado, e tendo em vista o cânone da saga previamente
estabelecido, talvez o lugar a que Luke se recolheu seja Tython, o planeta onde
a Ordem Jedi teve início há trinta e seis mil anos, ou Ossus, o planeta onde a
Ordem se consolidou antes de mudar-se para Coruscant.
Meu palpite é
que se trata de Tython, um planeta inteiramente regido pela Força e o local
onde os primeiros Force Sensitives descobriram como controlá-la e utilizá-la.
Se for esse planeta, talvez Abrams tenha acertado (um tiro no escuro? acerto de
principiante?) no argumento do retiro de Luke e do planeta onde ele se
encontra, pois estando a Força excessivamente fragmentada, um Mestre Jedi só
poderia encontrar respostas para suas indagações e preocupações no local onde
tudo começou.
Infelizmente, o
retiro de Luke é um elemento terciário no enredo do Episódio VII, praticamente uma nota de rodapé (pois é muito mais
interessante – e lucrativo, claro – focar na morte de Solo-pai pelas mãos de
Solo-filho), o que me leva ao segundo problema desse capítulo da trama.
O fato de Abrams
ter relegado o personagem Luke Skywalker a um plano excessivamente secundário,
bem como todos os eventos que o rodeiam e nos quais ele esteve envolvido direta
e indiretamente nos trinta anos passados da Batalha de Endor, acabou gerando um
efeito colateral preocupante: a falta do elemento filosófico, o qual sempre
esteve presente no decorrer da saga como
um todo, mesmo na Segunda Trilogia e no desnecessário Episódio I, tendo em vista que a Força
só pode ser entendida filosoficamente – ou seja, ela tem que ser interpretada
antes de ser usada –, uma vez que o Lado da Luz e o Lado Negro são pontos de
vista filosóficos sobre esse poder ancestral.
No contexto do Episódio VII, todos os mestres
detentores de conhecimentos mais profundos sobre a Força e capazes de ensinar
seus princípios filosóficos, na perspectiva Jedi ou Sith, estão mortos – Mestre
Yoda, Darth Sidious, Obi-wan Kenobi e Darth Vader – e não há ninguém a altura
para substituí-los a não ser o próprio Luke, que foi deliberadamente omitido no
enredo deste primeiro filme da Terceira Trilogia.
Não se pode
dizer que Luke, apesar de seus dons natos e grandes esforços, tenha se tornado
um mestre da envergadura de Yoda – lembremos as palavras a ele dirigidas pelo
próprio Yoda no Episódio V, “você é
imprudente”; lembremos ainda que, por um curto período de tempo, Luke se
bandeou para o Lado Negro na época em que um clone do Imperador tentou
reassumir o poder. No entanto, ele é o herdeiro direto da linhagem de mestres.
Aliás, o único herdeiro de ambos os lados da Força.
Kylo Ren, seu
discípulo, parece ter aprendido muito pouco com ele, e Snoke está longe de ser
um mestre como Darth Sidious, ainda que haja indícios no Episódio VII que apontam que ele pode ser bem mais poderoso no
Ladro Negro do que mostram as aparências e, por isso, tenha omitido muita coisa
de Ren.
De qualquer
forma, no contexto do primeiro episódio da Terceira Trilogia, passados trinta
anos da Batalha de Endor, a Força enquanto poder que organiza o Universo está
em grande perigo, prestes a se extinguir ou tornar-se errática e, portanto,
incontrolável. Não se trata mais de equilibrá-la ou desequilibrá-la, mas sim de
voltar a (re)conhece-la para poder senti-la e canalizá-la de algum modo.
Mistério
supremo, a Força é o que possibilita a existência de todas as coisas. Como tal,
pode ser pensada como uma imensa rede senciente que, diante de sua atual
situação, tende “naturalmente” a se reconstruir ao invés de deixar-se
obliterar. Isso explicaria, em termos filosóficos, por que ocorreu o despertar
em Rey e, muito claramente, em Finn: como nos primórdios em Tython, e sendo um impulso
fenomênico, a Força se manifestou novamente em seu estado mais puro, nem Ashla
(Lado da Luz) e nem Bogan (Lado Negro), apenas Poder. Por si só, ela não pode
existir nesse estado puro, pois é incompreensível em si mesma a qualquer
inteligência do Universo, mesmo aos Celestiais. Então, ela precisa
direcionar-se, tornar-se conhecimento, e é aqui que a querida Rey retorna ao
palco: em Araraquara... quer dizer, Jakku, a Força esteve com ela em estado
puro por algum tempo (o motivo, ou um dos motivos, pelo qual a personagem foi
ali abandonada, talvez). Mas, como essa situação não poderia permanecer assim,
o acaso, o Fado ou o Destino providenciaram para que Rey tivesse a sua própria
aventura e com isso chegasse ao local onde estava o lightsaber de Luke Skywalker, ao que tudo indica seu parente ou
alguém predestinado a cruzar seu caminho. De posse da arma do último mestre
vivo – que foi também a arma de Padawan do Escolhido –, a Força literalmente
“desperta” em Rey e a leva não apenas ao conhecimento do paradeiro de Luke, mas
também a ir até ele, em seu refúgio no planeta onde tudo começou, para lhe
entregar a arma, em um gesto que a torna, de certa forma, sua Padawan.
Em termos de
enredo, essa costura é perfeita: a Força desperta em alguém em um local
randômico e sem importância e, por meio de sua teia existencial, atrai esse
alguém até o local apropriado e a pessoa apropriada para que possa se tornar
conhecimento. Ao entregar o lightsaber
ao seu verdadeiro dono, Rey se torna, simbolicamente, uma Padawan, ou seja,
escolhe um direcionamento, uma canalização, uma expressão de conhecimento para
o Poder que a elegeu para “despertar”, para manter-se existente, conhecido,
senciente. Com isso, e dessa forma, a Força se renova em Rey e a torna,
literalmente, uma nova esperança.
Bem... uma
interpretação linda, não? Tudo se encaixa bonitinho, de modo até bastante
elaborado eu diria. Mas isso, minha gente, é a minha leitura, a leitura de um
profissional em leitura. Duvido muito que J. J. Abrams ou outro diretor façam
algo sequer semelhante ao que descrevi nos próximos filmes da Terceira
Trilogia, pois, infelizmente, J. J. Abrams – e qualquer diretor que a Disney
venha a contratar para dirigir Star Wars
– não entendeu (ou não quis entender, ou foi proibido de entender) o conceito filosófico
de Força, uma das ideias mais bem trabalhadas de George Lucas (que pode ser uma
droga de diretor, mas é um gênio em termos de ideias para enredo).
E por falar em
Rey como uma nova esperança, isso me leva ao terceiro e último problema mais
sério (este nem tão sério assim se comparado aos outros dois...) do Episódio VII: a incômoda semelhança do
seu enredo com o enredo do Episódio IV,
justamente o intitulado Uma Nova
Esperança.
Não vou fazer
uma comparação minuciosa entre os dois filmes, pois basta assisti-los e as
semelhanças ficarão gritantes (Tatooine vira Jakku, Luke vira Rey, R2-D2 vira
BB-8, Vader vira Kylo Ren etc.). De pronto, uma conclusão gritante para quem
assistiu a esses filmes em sequência: o Episódio
VII é, em tudo, um remake (ou
seria reboot?) do Episódio IV. Em outras palavras, temos,
a princípio e virtualmente, a repetição e não a continuação da saga Star Wars.
Direto ao ponto,
a questão que se coloca é: por quê? Por que tomar como base temático-estrutural
para O Despertar da Força o primeiro
episódio da Primeira Trilogia?
O resultado da
equação J. J. Abrams mais Disney daria como resposta a essas perguntas um
simples e categórico “falta de criatividade”, mal que vem assolando Hollywood
há bastante tempo e do qual nem mesmo Star
Wars escapou, ao que eu acrescentaria “dinheiro fácil e garantido”. Observo,
no entanto, algo que considero mais preocupante do que questões de mercado: o
fato das pessoas, dos expectadores nas salas de cinema, e principalmente dos
fãs da saga não terem notado que a continuação é, literalmente, uma repetição
disfarçada com pseudo-inovações, pseudo-novas-personagens, pseudo-novos-mundos
e cenários resultantes de um pseudo-enredo que na verdade é uma cópia de algo
feito no final do século XX turbinada para pseudo-públicos do século XXI.
Ninguém notou que a ideia central, a espinha dorsal do roteiro do Episódio VII é exatamente a mesma do Episódio IV. Todos viram o novo Star Wars como... novo.
Ponto para J. J.
Abrams e para o Departamento de Marketing da Disney, não há dúvida: eles
conseguiram vender o mesmo velho produto só mudando o seu rótulo, e fãs, cinéfilos,
público em geral e crítica especializada compraram e amaram o “novo” velho
produto. Para quê Hollywood se preocuparia com algo tão difícil e caro quanto criatividade?
Duas respostas
rápidas à questão, que são também duas conclusões rápidas, porém longe de serem
precipitadas: 1) o Pós-moderno é um fato cotidiano e corriqueiro; logo, teoriza-lo,
criticá-lo ou mesmo utilizá-lo já se tornou obsoleto (“bem-vindos ao deserto do
real” meus queridos sociológicos, antropólogos, escoladeFrankfurtianos,
marxistas em geral, positivistas, humanistas, realistas e coisas do gênero); 2)
o mundo emburreceu e isso não é culpa e nem tem nada a ver com o Pós-moderno. É
simplesmente isso: burrice, a mais preguiçosa burrice; “para que eu vou me dar
o trabalho de pensar se o Google, a Wikipedia e o Rotten Tomatoes pensam por
mim?”.
Acreditem, essas
duas conclusões em nada me preocupam. Já aprendi, há muito tempo, a lidar com a
burrice do mundo e a maquiavelicamente me aproveitar dela.
O que me preocupa é que cada vez mais eu gosto
menos do contemporâneo como fato histórico (apesar de amá-lo como teoria e
filosofia), e menos ainda das continuações das sagas fílmicas que amei.